terça-feira, 2 de fevereiro de 2016

2 Filmes e um Hot-dog.



2 Filmes e um Hot-dog.

Ah Réveillon, todos viajando, praia, exterior, nessa ultima semana de dezembro e primeira semana de janeiro a cidade de São Paulo fica um paraíso. Nenhum trânsito, nenhuma fila, podemos chegar aos restaurantes a qualquer hora, vagas no estacionamento ao lado dos elevadores, uma calmaria só. Já é o segundo ano que passo o réveillon na cidade e pretendo continuar assim.

Tudo isso pra dizer que aproveitei a primeira semana de janeiro para ir ao cinema assistir a dois (e não um) blockbusters e isso não é algo que eu faça rotineiramente. Por morar perto da avenida paulista, costumo ir ao cinema a pé, onde tem o Reserva Cultural e que não passa os filmes de grande circulação. Não meu caro leitor, assisto à filmes “cult” mais por comodidade do que por opção. Longas filas, trânsito, estacionamentos caros, salas lotadas. Tudo isso me afasta das grandes produções me deixando refém dos filmes de menor circulação.

Não pense que não gosto deles, ao contrário, são ótimos filmes para analisarmos. Hollywood tem uma agenda ideológica (esquerdista) e a expressa subliminarmente nos filmes, mais interessante ainda é ver que tem filmes que estão expressando uma nova corrente (libertária ou liberal clássica) e “furando” o bloqueio ideológico.

Mas, voltando ao assunto, aproveitei a primeira terça feira de janeiro, peguei meu carro e me dirigi ao shopping para ver os filmes, menos de 8 minutos depois lá estava eu, selecionei Imortais e Tudo Pelo Poder. Uma vez que estava lá, resolvi fazer o programa completo, sala 3D, hot-dog com cheddar, refrigerante e tudo mais. O interessante de ter visto os dois filmes, aparentemente sem ligação nenhuma um com o outro, é que eu esperava mais de Tudo Pelo Poder, uma vez que acompanho com empolgação as primárias Republicanas, observando o fenômeno Ron Paul, um libertário, quebrando a barreira dos neoconservadores e Imortais eu fui mais pelo efeito 3D, expectativa menor.

E não é que foi tudo ao contrário?

Imortais é um filme que vale a pena ser visto. Trata-se da mitologia grega que conta a batalha de Teseu com o Rei Hyperion, a batalha do bem contra o mal e como Zeus, o “chefe” dos céus ou Rei dos deuses ordena que os deuses nào ajudem a Teseu, regra essa que foi descumprida, gerando grande disturbio.
O Filme é uma pintura, muito bem feito e consegue passar valores como honra, lealdade, luta pelo bem, justiça e como o bem enfrenta o mal, o mal existe e precisa ser combatido pelo bem.

Já Tudo pelo Poder, que conta com direção e atuação de George Clooney, é um filme mediocre. E digo isso, não pelo filme reportar algo que todos sabemos, que a política seja algo sujo, é mediocre pois Clooney, ele mesmo um esquerdista militante na vida real, usou de uma inversão banal para influenciar nas próximas eleições americanas. Explico, ao mostrar os bastidores das corridas primárias do partido democrata, e expor toda sujeira que há nelas (mesmo com apelo para o bem com slogans ridículos como energia limpa ou outra bobagem demagógica da esquerda), Clooney pretende duas coisas. A primeira é passar a mensagem “se os democratas são assim, imaginem os republicanos”. A outra, e ai sim o pano de fundo, é que o filme não é sobre democratas e sim sobre republicanos. O partido democrata não terá eleições primárias, Obama concorre ao segundo mandato, já os Republicanos inicaram as primárias dia 3 de janeiro (mesmo dia que vi o filme) e esta sendo uma das mais disputadas dos ultimos tempos. O Filme, com isso, quer passar aos eleitores americanos que os republicanos estão vivendo essa sujeira agora e o candidato que sair vencedor das primarias será um escroque imoral (sim, é possível que seja mesmo, esse não é o ponto).

Chegando em casa, me ocorreu se era possível fazer algum contraponto entre os filmes, liga-los de alguma maneira. E penso que só o inverso pode uni-los. Imortais trata de um tempo (ou do mito formador de um tempo) onde a política da pólis, representava um conjunto de valores morais. Tudo pelo Poder nada mais é que o resultado de Maquiavel, o ápice do relativismo moral.

Façam suas escolhas.
Mozzarella Chiocca

Caros leitores do Cinema Semanal, estreio hoje uma coluna mensal nesse blog e venho aqui, me apresentar. Como o leitor do blog quer mais é saber de cinema escolhi um filme que me dá a chance de falar de cinema e de mostrar ao leitor o que ele pode esperar de mim nesse espaço.
Mozzarella Stories é um filme daqueles bem italianos, eu, como neto e com sobrenome italianíssimo, aproveito o filme paesano para dar as caras por aqui.

Mais do que isso, o filme me ajuda a colocar para vocês a que geração eu pertenço; e isso, logo na abertura, o leitor que for da minha geração vai se sentir no auditório do extinto programa do Záccaro do anos 80, apesar do filme se passar nos anos 2000 (e a festa em 99). Para os mais novos não ficarem perdidos, sintonizem na RAI em algum programa como La Prova Del Cuoco ou Porta a Porta e vocês verão que aquela festa, que beira o caricato, não é exagero nenhum.

Na festa, Ciccio, um fazendeiro produtor de Mussarela de Búfala, retorna da prisão após “problemas com um concorrente” (ele o assassinou) para assumir de vez o posto de Rei da Mussarela, coordenando o sindicato dos produtores. Toda a comunidade está em festa, são tempos de prosperidade e aquela alegria italiana é bem retrada. Tudo indica que o filme é uma boa comédia italiana, mesmo com a presença dos mafiosos que, naturalmente, levam uma parcela dos lucros. Ciccio não vê mal nisso, afinal, os negócios vão bem e isso, oras, isso faz parte da Itália.

Naqueles tempos felizes carreiras são promissoras como a do cantor Ângelo Tatangelo, o “cobrador” com nome perigoso, Zingaro Napoletano, a juventude da bela Sofia, filha de Ciccio.
Mas, de repente, esse quadro muda, o mercado de mussarela vê seus preços caírem vertiginosamente com a concorrência de um produtor chinês.

Nesse momento, o cantor Ângelo já casado com Sofia, é um fracasso não só na carreira como no próprio casamento pois ele ama sua ex companheira de palco, Autília, o Zingaro, intimado a cobrar os devedores de Ciccio, não assusta mais ninguém, e os felizes produtores se veem num beco sem saída. Apesar disso, o filme continua parecendo uma comédia, esse clima só é quebrado, e isso gerou uma perplexidade na plateia do cinema, com a surra que Ciccio dá em um de seus colegas do sindicato quebrando totalmente o clima de comédia, que depois o filme tenta retomar, mas já sem a leveza de antes.

Por que estou contando o filme se o leitor que viu, já viu e o que não viu quer ver?
Por que esse é o tipo de história que gosto de analisar, nem que seja para apontar os defeitos do filme. Nisso me parece que o diretor acertou pois é a imagem que tenho da Itália nos dias de hoje, a alegria esbanjadora dos anos 80/90 deu lugar a uma depressão econômica que pode levar a Itália a um calote como a Grécia. Aquela comédia ingênua do começo do filme agora dá lugar a uma agressividade e uma comédia menos suave (como se nota na morte de Autília, um tanto pesada).

O antigo aliado que Ciccio surrou por esse desconfiar de sua capacidade de gerir a crise e ofender sua filha volta para assassina-lo e tomar seu posto. Mas Sofia, aliada com o braço direito de seu pai, Dudo faz uma aliança com os chineses e, como seu pai, acaba com seu rival a chicotadas.

O notável, para um praxeologista como eu, é o pouco rigor na lógica econômica do sucesso dos chineses e a quase risível explicação que se dá para a solução dos conflitos no filme. Fica de bom desse filme a ilustração de uma Itália outrora feliz (e gastona) e agora uma Itália caída e sem otimismo com a crise econômica. E melhor que isso é a italianíssima Luisa Ranieri interpretando Sofia. Serve de distração para um filme com pouco nexo, como é a Itália hoje.

Cristiano Chiocca, praxeologista, economista e fundador do Instituto Mises no Brasil. Cristiano toda a primeira quarta-feira do mês escreve sobre as relações humanas no cinema sob a dimensão transcendetal.

“Inquietos, uma inquietude ortodoxa””, de Cristiano Chiocca


Inquietos, uma inquietude ortodoxa
Fui assistir ao filme Inquietos por pura falta de opção, nenhuma sinopse tinha me agradado e eu devia uma ida ao cinema a uma amiga, então lá fui eu o escolhendo quase que aleatoriamente. Como não creio em acaso, coincidiu de me deparar com o tipo de filme que gosto, que trata de grandes temas da alma com a sutileza dos símbolos.
Pouco importa aqui se foi intenção do diretor, mas eu vi o filme com olhos ortodoxos, mais especificamente cristãos, e acho que é a única lente que nos permite compreende-lo.
O protagonista se chama Henoc que na tradição bíblica é o nome de um dos patriarcas pré-diluvianos, filho de Cain e pai de Matusalém, tendo vivido por 365 anos e ascendeu ao céu, sem morrer, arrebatado por Deus após agrada-Lo.
No filme Henoc é um jovem que perdeu os pais em um acidente e vive a confrontar a realidade da morte, tendo por hábito visitar funerais de pessoas desconhecidas e cemitérios. Ai, além do nome, é clara a analogia ao Patriarca Bíblico que em sua longeva vida, encarou a morte de diversas pessoas, próximas ou não. Nos dias de hoje, falar, pensar, refletir sobre a morte é quase censurado, pessoas parecem buscar a juventude eterna com plásticas, e paranoias e o filme, propositalmente, coloca dois jovens reflexivos sobre o tema.
Em um funeral, Henoc conhece e logo se apaixona por Annabel, uma jovem paciente de câncer em estado terminal, ela uma darwinista, e aqui o leitor poderia me desautorizar a usar a lente cristã no filme mas o darwinismo de Annabel é totalmente condizente com essa visão. Ela enxerga que nada no mundo é por acaso, tudo tem um propósito. A serenidade com que Annabel encara sua doença é complementar ao seu darwinismo. Ambos, Henoc e Annabel tem consciência da morte e, mais ainda, de que a morte é um processo, uma passagem, uma páscoa. Henoc mais relutante, mais inseguro, com menos fé, eu diria, sofre com a iminente morte de Annabel e se revolta. É o apego às coisas “desse mundo” que Henoc ainda não conseguiu resolver dentro de si.
Quem o ajuda nessa tarefa é Hiroshi, a alma de um kamikaze morto na segunda guerra, e aqui a ortodoxia volta, os suicidas não descansam, a alma sofre a dor eterna, não descansa. Não obstante Hiroshi ajuda Henoc a não perder a realidade transcendental, a mesma realidade que aparece tão clara à Annabel no diálogo com sua aflita irmã, que não se conforma com a serenidade com que ela recebe a notícia que seu tumor estava aumentando. Annabel reflete sobre os 3 meses que lhe restam dizendo a irmã sobre quão ínfima é nossa passagem na terra, que 3 meses, 3 anos, 30 anos não significam nada. Annabel está se referindo aí à eternidade, ela sabe da brevidade da nossa vida aqui, e sabe também que a vida não acaba aqui, existe um propósito de estarmos aqui.
O simbolismo do filme me apareceu também em um sutil detalhe: pequenas simulações da morte, como quando eles desenham seus corpos no chão com giz ou quando simulam uma peça de teatro, é uma representação das pequenas mortes que enfrentamos na vida, é nessas pequenas mortes que Henoc se ira mas depois se acalma, é o exercício do desapego e esse exercício será doloroso ou suave dependendo de como o encaramos. Quem se apegar às coisas desse mundo perderá a vida e quem se desapegar terá a vida para sempre.
Henoc, no final do filme, percebe isso, abre um sorriso, sereno, seguro, cheio de gratidão, de confiança. Talvez seja esse o agrado que o patriarca Henoc fez a Deus para que fosse arrebatado ao paraíso sem a dor da morte.
Assistam o filme, é um belo poema sobre a vida.

Cristiano Chiocca, praxeologista, economista e fundador do Instituto Mises no Brasil. Cristiano toda a primeira quarta-feira do mês escreve sobre as relações humanas no cinema sob a dimensão transcendetal.